12 de julho de 2010

Arte Clássica e a Genitália PP

Tá certo que já faz quase um mês desde o último texto aqui, mas vamos continuar falando dos gregos (aqueles mocinhos alegres que criaram as bases da civilização ocidental, caso você seja um eremita).

Na verdade esse era pra ter sido o primeiro post do GNM, mas acho que eu ainda não tinhas as bases corretas pra escrever. Agora acho que já é possível. Vou tentar responder à questão magnânima, crucial e terrível da arte grega, aquela que se tornou o padrão clássico do ideal de beleza do corpo humano, aquela que fez Michelangelo parir o Davi, aquela que alguns dizem que era colorida, aquela linda e maravilhosa coisa que causa olhares tortos pra saber se não é de verdade... e que fez todos os homens como pintos minúsculos.

Isso. Alguém precisa falar disso! Essa pergunta não pode ser um daqueles tabus inexplicáveis na quinta série.

- É que tá frio!

Fídias (?). Hermes Logios. Cópia romana em mármore
a partir do original do século V a.C.


Todo mundo já se perguntou. Por quê? Por que os pipizinhos de molequinho nos corpos de homenzarrões?

Elenquemos hipóteses:

  1. Os gregos tinham, de fato, uma involução fálica.
  2. Os gregos preferiam coisas em tamanhos que não os machucassem. E tinham vergonhinha~
  3. Em contraposição à hipótese 1: os gregos eram modestos e não queriam ofuscar seus vizinhos europeus.
  4. Gregos consideravam coisas pequenas mais humanas, e maiores mais monstruosas.
  5. Nanomáquinas.


Pra dar uma escrutinada sobre o assunto eu vou usar Arte e Ilusão, do Gombrich (<3) e uns trechinhos de Greek Homosexuality, de Kenneth Dover, que achei perdidos por aqui. Vamos à análise.

I. Involução fálica

Bem, falar que os gregos tinham pinto pequeno seria falho. Eu acho. Se fossem japoneses dava pra falar com certeza. Podemos consultar a Wikipédia e procurar a média peniana mundial e a média dos gregos, pra ver se isso justificaria os pipis das estátuas. Mas não vamos fazer isso.

II. Frescura

Sabemos da preferência sexual dos gregos.

Tá, não sabemos, mas sabemos da fama. Eles basicamente eram capazes de ficar excitados com qualquer coisa que fizesse sombra e fosse capaz de gemer (ainda que essa segunda característica não fosse essencial, mas sabe como é, teria mais graça). Gente, é só pôr no papel os casos de Zeus. O deus-supremo helênico teve filhos com mulheres, árvores, pedras, consigo mesmo (masturbação não causa gravidez, não se preocupe), com animais, com conceitos da natureza, etc, etc. Veneravam um ninfomaníaco, é óbvio que eles não ligavam pra tamanho ou formato das coisas.

- Se liga no meu cajado.

Pintor desconhecido. Ganímedes fazendo uma libação a Zeus. c. 490 a.C.
(Zeus traçou ele depois, pra quem não conhece o mito)

Adorar um ninfomaníaco não era nada. Ao contrário de hoje em dia, na nossa sociedade judaico-cristã-obâmica-ocidental, os gregos ADORAVAM o corpo. Não que hoje não adoremos, mas é que eles não tinham pudores em mostrar seus atributos; não era um tabu pecaminoso ou coisa do tipo. Era mais pra “é bonito, mostre”. E tenha orgulho disso. Olimpíadas eram disputadas com todo mundo peladão. Usar roupas em eventos esportivos era considerado bárbaro (eles diriam out): ter vergonha do corpo era falta de civilidade. O que faz um sentido terrível, não?

III. Modéstia

Não.

IV. Que pênis grande você tem!

Oh, aqui encontramos mais um pouquinho de sentido. O pequeno e o grande, o natural e o monstruoso. Sim, isso era verdade. Haviam, sim, representações artísticas que envolviam pênis grandes, enormes, monstruosamente assustadores. Tinha até um deus do pinto, Príapo.

É daí que vem o termo "priapismo", minha gente.

Anônimo. Príapo-Hermes, ou Príapo com Caduceu.
Afresco em Pompeia, c. 89 a.C. - 79 d.C.


A diferença aqui era estética e simbólica: pipis pequenos eram reservados para a representação de homens comuns, enquanto os grandes (mesmo que visualmente “normais”) eram utilizados em seres selvagens, como sátiros ou animais.

V. Nanomáquinas

Na verdade não tem absolutamente nada a ver com isso aqui, mas é que seria divertido se tivesse.

Fala sério, hein?


Resumindo:

Tudo uma questão de ideal de beleza. Do mesmo modo que as estátuas eram representadas praticamente sem pêlos, por exemplo. Lembra do schemata, do post anterior? Ainda que os gregos tivessem superado a pressão do uso dos esquemas tradicionais, resquícios sempre existem. Pipizinhos eram um desses resquícios (sem trocadilho), do mesmo modo que praticamente todos os rostos eram iguais, todas as mãos, todos os cabelos e todos os padrões de vestimenta, a menos que estivessem deliberadamente representando algo único. Esquemas. Só que estamos tão condicionados pela nossa visão de sexualidade proibida, que a primeira coisa que percebemos é... o pinto. As outras coisas, tão estranhas quanto, desaparecem.

- Cobra filha da mãe!

Hagesandro, Athenedoro e Polidoro. Laocoonte e seus filhos.
Cópia em mármore a partir de um original de 200 a. C.

Na cabeça dos gregos, um pipi pequeno, lisinho e não circuncidado era mais olhável que uma coisa grossa, feiosa e grande. Esses eles deixavam pra velhos tarados e bichos. Além do mais, pênis grandes eram um símbolo de fertilidade, e esse era mais um dos motivos pelos quais eles não eram representados dessa maneira; as estátuas e pinturas, sendo a maioria delas simbólica, não eram de deuses da fertilidade, e sim de homens mortais. Colocar uma coisa ali que aparecesse demais iria mudar o significado todo da coisa.

Para finalizar, isso não aconteceu só com os gregos. Coisas fálicas mais coisudas são associadas à pura sexualidade, fertilidade ou selvageria em outras culturas. Especialmente na “nossa”. Por exemplo, numa passagem de Ezequiel, 23: 20, temos o relato bizarro sobre a profissional do sexo Ooliba, que ardia em amor “por luxuriosos, cujo membro era como um membro de asno, e sua lubricidade igual à dos cavalos.” (citar a Bíblia significa que eu estou certo).

Como a arte grega foi a base da pintura e da escultura até o Renascimento, é claro que por muito tempo os homens foram representados com um membrinho. A partir da quebra dos cânones da arte renascentista, ali depois do século XVII, tudo se normalizou, e temos pintos normais.

Mas não temos mais tantos nus masculinos. Não é um padrão interessante?